Palavras sem significado

       Havia um livro em suas mãos, sem palavras. Apesar de escritas quase 46.000 delas. Havia muitas dúvidas se elas existiam, diziam-se ou multiplicavam-se. Não eram essas, aquelas palavras, as ditas. Ditas cujas que por qualquer um dos dois, poderiam ser lidas.
      De fato, só havia um lado apto a atravessar os abismos semânticos ali contidos. Enquanto do outro lado, mesmo que olhando-as, ainda não se podiam lê-las, as palavras. Sem falar, nas leituras sonoras que decifrariam o medo, a solidão e a asperesa desse informante. Sentimentos esses deixados para trás. Não que eu enxergue ou perceba a presença de tais elementos.
     O que muda? Talvez não importe. Não importa não ver alem da profundidade que pudesse haver. As linhas de interpretações que intercalam-se com as leituras prévias. Em outras palavras, aquelas não ditas. O que eu quero dizer com isso se resume a uma pergunta: é preciso entender com igualdade as coisas da vida? Deve haver um nível, que reflete sobre o quanto se entende para  que outro seja entendido; um nível que diga o quanto não entendido o outro é. 
     De qualquer forma, não iriam se entender os Homens de Neandertal, se isso fosse preciso. Isto é, e se a palavra não for tão importante, tão afiada e inteligível  quanto as dimensões polissemicas do homem? Para ser mais específico, levanto a tona a pergunta: quem diria que o homem primitivo nunca amou? Ou o amor nasce após o Romantismo medieval? Ou são apenas as histórias, com palavras.
     Portanto, não há livro de História que contasse essa história mal contada. Surgiria o amor com as palavras ou será que ele justamente morreu após seu surgimento? Seria um amor menos original? Havia um livro em sua mão sem palavras, respostas às perguntas dadas, pensou ela, a menina que amava Eduarda.

"Não quero ter a terrível limitação de quem vive apenas do que é passível de fazer sentido. Eu não: quero uma verdade inventada." Clarice Lispector


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