Segurei o sol

         Mesmo que hoje ainda eu falasse o óbvio, não seria suficiente. Foi o que pensei ao voltar em meus pensamentos    há alguns anos atrás.
        Esperava sob a chuva sentado no meio-fio entre a calçada e a rua. Estava na frente da sua casa. Esperando uma ligação que fizesse sentido. Nariz fungando, frio que te encolhe e a água batendo contra minha lateral incessante. Continuei firme, pois valia a pena esperar, afinal era você, da outra cidade, sob uma convulsão emocional por causa minha ( hoje vejo bem que  por causa sua mesmo ). Fitei o fim da rua quando o relâmpago iluminou o poste desligado e havia uma nuvem logo atrás com o formato de seu rosto. Pensei em te contar caso ligasses, iria te dizer que havia te visto feliz e que tinha consegui até mesmo perceber os seus dentes no meio daquela escuridão. Mas segundos depois desanimei-me com a certeza de que você não iria acreditar ou mesmo me dar razão, sentir-se instigado. Noutro dia, pela manhã, havia pensado em te dizer que as janelas do prédio onde estudo, em um vendaval, quebraram-se uma a uma, inclusive uma que estava encostado. Sorte a minha que saí dali para te enviar uma mensagem perto das escadas, aonde havia sinal da operadora. Não seria muita coincidência você ter me salvado? Acontece que, de certa forma, isso não tinha nada a ver conosco. Isso o que? Vincular a realidade com a fantasia ( pelo menos foi o que você disse quando tentei te contar ). No nosso último final de semana fui à praia e você me perguntou o que eu estava fazendo lá. Eu  o respondi que estava tentando pegar o sol. Você disse que eu estava mentindo e que era pra ser realista e te respondi o mesmo, esperando que você reagisse diferente. Meu peito apertou e sua voz se enrijeceu. E depois de abusar de minha tolerância, você se desfez de mim como faz com absorvente.
           Te liguei milhões de vezes e fui na tua casa, bati na tua porta e imaginei que você iria desculpar-se, me abraçar e me beijar; imaginei que você  iria querer me entender, se sentando no sofá e perguntando o que estava acontecendo; imaginei que você se arrependeria e perceberia que sempre te quis bem; imaginei que você apenas estava insegura e iria tentar melhorar; também imaginei que você poderia abrir a porta e dizer que eu estava sendo imaturo e que tinha mudado de idéia: eu era muto novo pra você; imaginei que você poderia estar com alguem e me mandaria ir pra casa ver desenho animado; imaginei que você iria dizer, "desculpa, mas acabou para sempre". Mas isso tudo é ficção: a única coisa que não imaginei era que você se mudaria e nunca mais atenderia ou ao menos retornaria uma ligação. A realidade é que você me deixou ali na chuva com o seu sorriso que nem sei se é seu;  um buraco no peito no lugar que habitava um coração; com um amor que nem sei se aconteceu; e uma foto daquele domingo de primavera na praia.

   

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