Cassino

    No céu de São Bernardo do Campo o dia era ensolarado e com algumas nuvens. Um sol batia nas lonas das tendas dos ambulantes. Entre um vendedor de milho em prato descartável e outro, atravessei as lojas da Marechal. Tentei desviar com meus pés dos filmes espalhados por cima de cangas de praia ou tecidos de rendas surrados do uso diário. Precisaria apenas de um brinco. Uma argola em formato de anel. Percorri o lobo de minha orelha esquerda com a ponta de meus dedos. Não seria necessário pedir ou exigir permissão a ninguém. Apenas caminharia ao estúdio naquele meio da tarde de Agosto para a transferência de espírito. Era limpo e com um grande número de adereços e procedimentos profiláticos. Naquele lugar não havia qualquer índice de descuido. A organização do estúdio era impecável. Se eu tivesse qualquer intenção de abandonar a causa, não a teria feito. Fui recomendada que sentasse assim que tentei agrupar justificativas para não tomar a cabo a perfuração da minha orelha. Outra época eu teria me sentido culpada pela iniciativa de ter insurgido contra as ideias da mãe. Não sentia-me assim e isso devia a mudança tanto geográfica quanto íntima que eu teria me predisposto na transição do inverno para primavera que me precedia. Os tempos eram outros e a vida apontava para um paraíso: o roseiral descoberto em um espelho de elevador que ascendia até meu novo apartamento. Não era um par de brincos, era apenas um brinco novo e nada decorativo. O brinco era simples mas era tudo o que se propôs ao sair de um dos lados de sua circunferência até afivelar-se a sua outra extremidade. Assim a vida relava-se nesta nova cidade dentro de uma proposta mais sincera e estruturada. Sem a guerra dos desejos de sua mãe ou as imposições da revista que servia como modelo. Os frutos de sua estrada aos poucos pareciam mostrar suas cores, assim como as flores desabrochavam nos vasos dos canteiros de seu condomínio. Pensei no que a arte poderia me trazer no tempo que agora julgava ao meu favor. Um novo dia se desdobrava sob a grama cheirosa das várias pracinhas espalhadas por Jordanópolis onde destinos eram assobiados no canto dos sons da natureza. Iam se sobrepondo as casas que lembravam para ela a água, o equilibrio e talvez alguma parte do interior do Cassino.

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